< 1945

O casarão que abriga a atual Cantina da Lua tem uma longa história, cuja origem remonta ao século XVII. Foi pelas vistas do sobrado localizado na esquina da antiga rua das Portas do Carmo com o Terreiro de Jesus que passaram vitoriosos os heróis de Pirajá, após duros combates pela Independência da Bahia, no ano de 1823. Anos antes, o espaço acolheu a primeira agência do Banco do Brasil do país, chamada, à época, de Casa do Banco, e também foi sede da Diretoria e da Secretaria da Faculdade de Medicina da Bahia. Posteriormente, a propriedade foi berço do nascimento do poeta e dramaturgo Agrário de Menezes, sede de jornais da cidade e da Pastelaria Pombo, até abrigar o Bazar Americano, a partir de meados da década de 1930.

1945

Renato Santos inaugura a Cantina da Lua no dia 28 de abril de 1945, ocupando duas portas do casarão localizado no nº 2 da Praça Quinze de Novembro, popularmente conhecida como Terreiro de Jesus. O bar faz limite com a Igreja de São Pedro dos Clérigos e com o Bazar Americano, estabelecimento de propriedade de Eduardo Augusto dos Reis que, anos mais tarde, teve como sócio seu genro Walter da Costa Pinto. Nesta fase inicial, a Cantina da Lua é frequentada por doqueiros, estivadores, marinheiros e policiais da extinta Guarda Civil, além de estudantes e funcionários da Faculdade de Medicina da Bahia e de servidores de órgãos públicos com sede no Centro da cidade

1955

Aos 13 anos, Clarindo Silva começa a trabalhar no Bazar Americano como empregado doméstico, permanecendo como funcionário do estabelecimento por 17 anos. Ao longo do tempo, ocupa os cargos de auxiliar de balcão, balconista, batedor de ferrugem, subgerente, gerente e contador. Anos mais tarde, cursa Jornalismo e trabalha como repórter policial nos jornais A Tarde, Jornal da Bahia e Tribuna da Bahia. Com o tempo, migra da reportagem para a literatura, não deixando de usar a pena para a defesa intransigente da região do Pelourinho em textos publicados no Jornal do Centro Histórico e nos informativos da Associação de Comerciantes do Centro Histórico de Salvador (Acopelô), da qual se tornaria presidente por duas gestões.

1971

Clarindo Silva arrenda a Cantina da Lua, reinaugurando o estabelecimento no dia 15 de abril de 1971. A partir da década de 70, o espaço se transforma em um ponto de efervescência e resistência cultural do Centro Histórico de Salvador, frequentado por artistas, sambistas, jornalistas, intelectuais, radialistas, políticos e pela comunidade local, passando a atrair a atenção da imprensa, do poder público e de turistas de todas as partes do Brasil e do mundo. Neste ano, Clarindo Silva participa da criação do Revicentro, movimento que atua em prol da defesa e da revitalização da região central da cidade. O projeto logo torna-se alvo de manobras políticas e acaba perdendo a sua força inicial de mobilização e articulação, deixando de existir em 1979.

1973

É lançado na Cantina da Lua, em noite de gala, o álbum Samba da Bahia, apresentando Riachão, Batatinha e Panela, amigos pessoais de Clarindo Silva e frequentadores assíduos da casa. Considerado um clássico do samba baiano, o disco traz em seu elenco nomes como Cacau do Pandeiro, Edson Sete Cordas, Maestro Vivaldo Conceição, Edil Pacheco (que também atua como arranjador e produtor) e Armandinho. Gravado ao vivo no Teatro Vila Velha, em Salvador, o álbum de estreia dos sambistas soteropolitanos também conta com textos de Paulo Lima (coprodutor do disco), Maria Bethânia e Paulinho da Viola.

1975

Clarindo Silva compra a Cantina da Lua das mãos de Renato Santos. Dois anos antes, em 1973, adquire o ponto da Ladeira do Prata, nº 1, inaugurando a Cantina da Lua Nova, primeira filial da casa matriz com sede no Pelourinho. No final da década de 1970, dois novos empreendimentos são inaugurados: o Astronauta Lanches, no Cruzeiro de São Francisco, e a Nave da Barra, na Rua Afonso Celso. Todos os estabelecimentos fecham as portas em meados da década de 1980, com exceção da Cantina da Lua. Neste período, a região central da cidade passava por um processo de progressiva degradação e desvalorização do seu patrimônio arquitetônico e cultural, sofrendo o impacto do descaso do poder público e da transferência de atividades comerciais, de órgãos públicos e da imprensa para outros bairros de Salvador.

1977

No segundo semestre de 1977, ao longo de quase dois meses, o cineasta Nelson Pereira dos Santos faz da Cantina da Lua seu escritório particular e espaço de sociabilização da equipe de produção do filme Tenda dos Milagres, ambientado na região do Centro Histórico de Salvador. No local, são tomadas decisões técnicas de filmagem e de argumentação de roteiro, e os atores, caracterizados com trajes dos anos 20, descansam e molham as palavras entre uma gravação e outra. Adaptação do romance homônimo de Jorge Amado publicado em 1969, o filme traz como protagonista o personagem Pedro Archanjo, ojuobá (olhos de Xangô) de candomblé, negro, capoeirista e cientista social autodidata, que atua em defesa dos direitos sociais das populações negras de Salvador.

1977

Idealizada pelo poeta Gildásio Freitas e por Giuseppe Talento (o “Arquiteto do Amor”), frequentadores da Cantina da Lua e grandes amigos de Clarindo Silva, a Noite em Homenagem a Noel Rosa celebra a memória do compositor carioca, que naquele ano completava quatro décadas de falecimento. Promovido anualmente no dia 4 de maio, trata-se do evento mais antigo realizado pela Cantina da Lua de forma ininterrupta. Em edições especiais, o evento chegou a ser transmitido ao vivo pela Rádio Globo AM, no programa de Adelzon Alves, “O Amigo da Madrugada”, contando com a participação de grandes sambistas e seresteiros da cidade. A Noite de Noel é um dos mais tradicionais eventos realizados em homenagem ao autor de “Com que roupa?” em todo país.

1978

Com o fechamento do Bazar Americano, Clarindo Silva compra todo o andar térreo e o piso superior da Cantina da Lua, que passa a abranger seis portas altas frontais voltadas para o Largo do Terreiro de Jesus, e três portas laterais para a Rua Alfredo de Brito (antiga Rua Portas do Carmo). Com a nova aquisição, o primeiro andar da Cantina da Lua – também batizado como Jardim Suspenso da Lua Cheia e Acoplamento Lunar – transforma-se em um importante espaço cultural e boêmio da cidade de Salvador, sediando exposições de artes, lançamentos de livros, programas radiofônicos, apresentações musicais, desfiles de moda, peças teatrais, exibições de filme, entre outras atividades artísticas e culturais.

1978

Em 1978 e 1979, a Feijoada da Lua é eleita a melhor da Bahia pela Revista Amiga. O toque de mestre do feijão é o tempero especialmente preparado por Clarindo Silva, um segredo de família guardado a sete chaves. A feijoada é o prato mais tradicional da Cantina da Lua, adquirindo adeptos fiéis ao longo dos anos e abrindo as portas para que o restaurante incluísse outras iguarias no cardápio da casa, entre elas o também tradicional Angu Encubado, preparado com pirão de feijão e carne de sol. A Feijoada da Lua é um dos carros-chefes da culinária do restaurante e pode ser degustada ainda hoje pelos amantes do bom feijão. Mestre Calá garante que o tempero é especial!

1979

Noite de autógrafos do livro A cidade que não dorme, de Jehová de Carvalho, e inauguração da primeira placa da Cantina da Lua, dedicada ao poeta. As placas – com nomes de ruas, praças, becos, avenidas, bosques, condomínios, conjuntos habitacionais e outros logradouros – representam verdadeiros marcos de memória e de reconhecimento dedicados a personalidades e amigos que contribuíram com a luta em defesa do Centro Histórico de Salvador e prestaram apoio ao Projeto Cultural Cantina da Lua, que seria criado anos mais tarde. Estima-se que cerca de 124 placas foram inauguradas na Cantina da Lua, homenageando artistas, intelectuais, jornalistas, políticos, agentes culturais, amigos e familiares do anfitrião da casa.

1979

Clarindo Silva cria a FM 4.44 Frequência Motivada da Lua, pioneira rádio comunitária do Centro Histórico de Salvador que, em três edições (meio-dia, 18h e meia-noite), leva aos frequentadores da região um misto de música, informações, hora certa, dicas de roteiros culturais, poemas, denúncias, entrevistas e canjas à capela de sambistas como Riachão, Batatinha e Ederaldo Gentil. Para tal empreitada, bastava um microfone, um amplificador e duas caixas de som amarradas à janela do sobrado e viradas para o Terreiro de Jesus. O ritual, empregado com pontualidade britânica, é levado a cabo pelo radialista Clarindo Silva, diariamente, ao longo de duas décadas, de 1979 a 1999.

1981

A Cantina da Lua edita e publica o livro A Mulher de Aleduma, escrito por Aline França com ilustrações de Nivaldo Brandão. Em uma narrativa ficcional, o livro tematiza o processo de povoamento do continente africano pelos habitantes de Ignum, seres de inteligência altamente desenvolvida que carregam uma espécie de “bolsa de energia” no lugar do cérebro, potencializando a sua capacidade de percepção e pensamento. Os assessores técnicos da obra são o biólogo Antonio de Souza Batista e a antropóloga Yeda Pessoa de Castro, ambos docentes da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O livro é lançado no dia 11 de julho de 1981, durante o Encontro de Entidades Negras da XXXIII Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

1981

Em 1981, o sambista Riachão lança, às vésperas de completar 60 anos, seu primeiro álbum individual, Sonho do Malandro, em produção financiada pelo Desenbanco (atual Desenbahia), instituição na qual trabalhava à época. Sem contar com um bom trabalho de distribuição e divulgação, o disco tem, em um primeiro momento, poucas vendagens. Em vista disso, Clarindo Silva promove um grande evento de lançamento na Cantina da Lua, com a presença massiva da imprensa, divulgando pessoalmente o evento em programas esportivos e de paradas musicais. Com a ampla divulgação, o LP – jamais reeditado em CD e, hoje, objeto de colecionador – teve, finalmente, as vendas impulsionadas.

1982

A Cantina da Lua edita e publica o livro de poesias Pássaro Azul-Manhã Celeste, de Léa Fonseca e Georgiton Ganner. No texto de orelha do livro, Clarindo Silva revela que a obra traz à tona a reflexão e a busca pela compreensão do mundo contemporâneo, “suas formas de amar, suas angústias e seus dramas sociais”. Natural de Barra do Tarrachil, localidade do município baiano de Chorrochó, Léa Fonseca é poeta e escritora autodidata, acadêmica de Artes Industriais do Ceteba (Centro de Educação Técnica da Bahia), atriz de teatro, diretora e fundadora do GAU – Grupo Acadêmico Universo. Entre seus temas de investigação poética estão a liberalização humana e os problemas sociais do Nordeste do país.

1983

Ladeado por familiares, sambistas da cidade e fiéis companheiros de jornada, como os amigos Rêmulo Pastore, Silvio Mendes e Julio Cesar de Assis, Clarindo SIlva cria o Projeto Cultural Cantina da Lua, cuja bandeira primeira é “a luta pela revitalização do Centro Histórico e pela preservação da memória cultural da própria Bahia”. A estreia do projeto acontece em uma terça-feira com o show Os Onze de Ouro, organizado em um palco improvisado ao redor da Cantina da Lua, onde se apresentaram os sambistas Batatinha, Riachão, Edil Pacheco, Ederaldo Gentil, Claudete Macedo, Tuninha Luna, Walmir Lima, Paulinho Camafeu, Nelson Rufino, Tião Motorista e Bob Laô. Apesar do fracasso de público, o evento representa um marco da atuação política e cultural da Cantina da Lua na luta em defesa do Centro Histórico da cidade.

1985

Com direção de Octávio Bezerra e fotografia de Miguel Rio Branco, é lançado o curta-metragem A Resistência da Lua. O filme é uma denúncia sobre o abandono e o processo de crescente degradação em que se encontrava o Centro da cidade de Salvador na década de 1980, lançando luz à atuação da Cantina da Lua como espaço de resistência da cultura negra e de luta por direitos sociais para os moradores da região. O filme ganha o prêmio de Melhor Documentário no VII Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano de Havana, em 1985, e é vencedor do Tatu de Ouro na XV Jornada Internacional de Cinema da Bahia, em 1986.

1985

No dia 3 de dezembro de 1985, o Centro Histórico de Salvador é tombado Patrimônio Histórico da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Nesta data, Clarindo Silva inaugura um marco alusivo ao tombamento confeccionado em pedra de mármore e instalado na entrada da Cantina da Lua. Um show comemorativo é organizado pelo Projeto Cultural Cantina da Lua, atraindo cerca de três mil pessoas no Terreiro de Jesus. O evento contou com a participação dos sambistas Riachão, Batatinha, Ederaldo Gentil, Walmir Lima, Bob Laô, Balbino do Rojão, Claudete Macedo, Miriam Tereza e Tuninha Luna, além do afoxé Filhos de Gandhy.

1985

Em outubro de 1985, em uma articulação de Carlos Moura, assessor para assuntos étnicos do Ministério da Cultura, Clarindo Silva recepciona a comitiva do ministro Aluísio Pimenta na Cantina da Lua e faz pronunciamento histórico na Câmara de Vereadores e na Irmandade dos Homens Pretos, no Largo do Pelourinho. Na ocasião, Clarindo entrega ao ministro o Manifesto à Nação, endereçado ao presidente José Sarney, denunciando a degradação física e o descaso do poder público com os moradores do Centro Histórico de Salvador. Ao longo de sua história, quatro ministros da Cultura visitaram a Cantina da Lua, sendo o ministro Aloísio Pimenta o único a assinar um protocolo de intenções alocando verbas para recuperação de parte da região central da cidade.

1986

Em seu primeiro dia à frente da Prefeitura de Salvador, Mário Kertész despacha com seu secretariado no 1º andar da Cantina da Lua. O acontecimento decorre da promessa feita pelo político de que, caso não conseguisse instalar a administração municipal no Palácio Rio Branco, situado na Praça Thomé de Souza, tomaria a simbólica atitude de iniciar o mandato no restaurante. Àquele tempo, havia uma concorrida disputa pela utilização do histórico edifício, que acabou abrigando o Memorial dos Governadores Republicanos da Bahia. Entre os anos de 1986 e 1987, a Cantina da Lua torna-se um espaço de referência da gestão de Kertész, sediando inúmeras reuniões de dirigentes municipais, sobretudo de presidentes  da Fundação Gregório de Mattos da época, como Gilberto Gil e Waly Salomão.

1986

Em 1986, a Noite do Samba e do Dendê, evento que celebrava desde 1972 o Dia Nacional do Samba em Salvador, tem sua realização colocada em xeque pelos principais nomes do samba da cidade, como Riachão, Batatinha, Edil Pacheco, Tião Motorista, Ederaldo Gentil e Nelson Rufino. O motivo: o descumprimento por parte da Emtursa, órgão ligado à Prefeitura, em relação ao cachê acordado anteriormente com os sambistas. Clarindo Silva, por meio do Projeto Cultural Cantina da Lua, viabiliza a celebração no Terreiro de Jesus, que conta com uma missa festiva na Igreja de São Pedro dos Clérigos, além da tradicional Festa da Bênção. Na luta pela revitalização do Centro Histórico, o Projeto promove, ainda, o Samba no Terreiro, reunindo grandes nomes do samba da capital aos sábados no Terreiro de Jesus.

1987

A atuação de Clarindo Silva em defesa do Centro Histórico de Salvador, impulsionada pelas ações desenvolvidas pelo Projeto Cultural Cantina da Lua, o leva a ocupar importantes cargos administrativos entre o final dos anos 80 e meados dos anos 90. De 1987 a 1990, durante os governos de Waldir Pires e Nilo Coelho (ambos do PMDB), Clarindo Silva ocupa o cargo de assessor do IPAC (Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia) nas administrações de Ordep Serra, Márcia Santana e Regivalter Alves de Brito. No âmbito municipal, exerce a função de administrador da Regional Centro na gestão de Lídice da Mata (PSDB), entre os anos de 1993 e 1996, quando elabora um plano de trabalho de recuperação de 21 praças, do Plano Inclinado, do Elevador do Taboão, da Feira de São Joaquim e do bairro do Comércio, entre outros espaços públicos da região central da cidade.

1991

Em solenidade realizada na Catedral Basílica de Salvador, Clarindo Silva entrega a Carta da Cantina da Lua ao Papa João Paulo II, denunciando a degradação crescente do Centro Histórico, a esterilização de mulheres negras, o ódio racial, a mortalidade infantil e o abandono da Igreja da Barroquinha e da Faculdade de Medicina da Bahia. Como resposta, o Sumo Pontífice se compromete a incluir em suas orações o encaminhamento das soluções para as denúncias apresentadas na carta. Entre os 400 convidados ilustres que participam da cerimônia ao lado de Clarindo Silva, estão Vovô do Ilê e Petú do Olodum. Clarindo Silva considera este um dos momentos mais importantes de sua vida.

1992

Clarindo Silva filia-se ao PDT na tentativa de obter uma vaga na Câmara dos Vereadores de Salvador nas eleições municipais de 1992, trazendo, mais uma vez, a defesa do Pelourinho como principal bandeira política. Antes, o proprietário da Cantina da Lua já havia se candidatado, sem sucesso, a deputado estadual (1986) e a vereador (1988) pelo PMDB. Entre as principais propostas de sua candidatura estão a “revitalização física, social e econômica” do Centro Histórico, com a prioridade de manter as famílias e os antigos moradores em suas habitações; a reativação das funções dos Conselhos Municipais do Negro e da Mulher; e o fortalecimento do comércio local. Apesar do empenho, Clarindo não alcança votação suficiente para a eleição ao cargo.

1992

Os recorrentes incêndios ocorridos em casarões do Pelourinho no final dos anos 80 e início dos anos 90 motivam Clarindo Silva a criar a Fundação Criançarte de Salvador, um projeto com foco na educação patrimonial, que tinha como principal compromisso o resgate da cidadania de meninos e meninas de rua do Centro Histórico da cidade e que contou com a participação das artistas e educadoras Gláucia, Dindinha, Rita, Lucinha Nobre e Kátia Melo como suas grandes companheiras de jornada. Seu estatuto traz as seguintes linhas de atuação: desenvolvimento de atividades educativas, culturais e recreativas e oferecimento de educação formal para crianças e adolescentes; desenvolvimento das potencialidades artísticas junto às crianças através de suas próprias experiências de vida; e o oferecimento de cursos profissionalizantes a filhos de mulheres prostitutas sem referência familiar e com alto grau de exclusão social. Durante os encontros, as crianças aprendem diferentes linguagens artísticas e visitam ruas, vielas e bairros do Centro Histórico de Salvador na companhia de Clarindo Silva e da professora Carmela Amaral, que lhes contam sobre a memória dos casarões e das centenárias entidades e associações civis com sede naquela região.

1993

Entre 1983 e 1993, o Projeto Cultural Cantina da Lua realiza centenas de eventos no Centro Histórico de Salvador, apresentando ao público shows com grandes nomes da música brasileira, como Waldick Soriano, Martinho da Vila, Moraes Moreira, Pinduca, Zezé Motta, entre outros artistas. Neste mesmo período, cerca de 60 autores têm seus livros lançados na Cantina da Lua. A cinematografia baiana também ganha obras premiadas através da Cantina da Lua, como a produção do curta-metragem A Resistência da Lua, dirigido por Octávio Bezerra. O restaurante também se transforma em sala de exibição de dois longas-metragens produzidos na Bahia e palco de, pelo menos, quatro peças teatrais. Festivais de bandas e fanfarras, de quadrilhas e de músicas de blocos afro e afoxés também têm lugar de destaque entre as realizações do Projeto Cultural Cantina da Lua ao longo de seu primeiro decênio.

1995

Em 1995, ano que marca o Cinquentenário da Cantina da Lua, o Jornal do Centro Histórico publica uma edição especial dedicada à celebração da efeméride. Coordenada pelo jornalista Renato Almeida, a publicação traz uma série de textos e fotos apresentando a história do estabelecimento que é símbolo da luta pela preservação do Centro Histórico de Salvador. A biografia de Clarindo Silva, o histórico da casa construída no séc. XVII, as ações desenvolvidas no âmbito do Projeto Cultural Cantina da Lua e perfis de algumas personalidades que frequentaram o local têm destaque no periódico que historicamente deu luz à atuação de Clarindo Silva na região. Ainda como parte das celebrações do Cinquentenário, é realizado um show no Terreiro de Jesus com a presença de João Nogueira e de sambistas da capital baiana.

1995

Nas mesas da Cantina da Lua, muitos discursos e crônicas do advogado, jornalista, poeta e cronista Jehová de Carvalho são declamados e escritos. Amigo de primeira hora de Clarindo Silva, o baiano de Santa Maria da Vitória faz do restaurante sua redação, espaço de debates, oficina de ideias e escritório particular, onde redige grande parte de seus textos veiculados em jornais da cidade. Em 1995, Jehová de Carvalho escreve Memória da Cantina da Lua, publicação que é, ao mesmo tempo, um documento de memória e uma homenagem ao estabelecimento que foi seu principal reduto de boemia. Última obra lançada em vida, o livro-tributo é editado pela EDUFBA (Editora da Universidade Federal da Bahia), em parceria com o Centro de Estudos Afro-Orientais e a Câmara de Vereadores de Salvador, sendo a primeira publicação literária totalmente dedicada à Cantina da Lua.

1996

A caipirosca e a caipirinha da Cantina da Lua são premiadas no XXI Troféu Internacional do Turismo, Hotelaria e Gastronomia, ocorrido no Hotel Meliá Castilla, em Madrid, na Espanha. A história da Cantina da Lua com a cultura etílica tem início com as infusões de cravo, erva doce, catuaba e outras bebidas preparadas com aguardente de cana, que marcaram época junto aos frequentadores amantes da “água que passarinho não bebe”. A mais conhecida foi o cravinho – que leva cachaça, mel, limão e cravo – lançado no dia da inauguração do Projeto Cultural Cantina da Lua, e que permanece sendo, ainda hoje, o carro-chefe da casa. A batida de pitanga e a batida Gabriela – “a batida do seu coração” – também são sucesso de público e são comercializadas para outras capitais do Brasil e até mesmo exportadas para outros países.

2002

Em junho de 2002, Clarindo Silva assume a presidência da Associação dos Comerciantes do Centro Histórico de Salvador (Acopelô), realizando em sua gestão – levada a cabo até o ano de 2005 – uma grande reestruturação da entidade, que, à época, estava com sua sede fechada e sem associados adimplentes. Além de passar a exercer um papel ativo junto a órgãos governamentais como a Bahiatursa, a Secretaria Municipal de Turismo e o Conselho Estadual de Turismo, a associação tem, pelas mãos de Clarindo, inaugurado um informativo bimensal e uma série de parcerias estabelecidas, incluindo cursos de capacitação técnica e de ensino de idiomas ofertados a empresários da região. Junto aos trabalhadores informais, a Acopelô incentiva a criação da Associação dos Vendedores Ambulantes do Pelourinho e da Associação dos Barraqueiros do Terreiro de Jesus. Em 2016, Clarindo retorna à presidência da Acopelô e permanece no cargo até 2019.

2004

Clarindo Silva lança na Cantina da Lua, em concorrida noite de autógrafos, seu primeiro livro, Memórias da Cantina da Lua (edição do autor), trazendo recordações pessoais sobre o restaurante cuja história se confunde com sua própria trajetória de vida. A publicação conta com a apresentação do prefeito de Salvador Antônio Imbassahy e o prefácio do jornalista Fernando Coelho, além de textos de amigos e personalidades soteropolitanas, como o sociólogo Gey Espinheira, a escritora e poetisa Cristina da Costa e os jornalistas Anísio Félix, Egnaldo Araújo e Tasso Franco. A narrativa apresenta a história da Cantina da Lua desde seus primeiros tempos – quando ainda era comandada por Renato Santos e dividia o casarão com o Bazar Americano – até o momento da escrita do livro, quando já havia ganhado fama internacional e feito de Clarindo Silva, proprietário do espaço desde 1971, uma das grandes personalidades da Bahia de seu tempo.

2008

Clarindo Silva é eleito Rei Momo do Carnaval de Salvador. A escolha é repleta de polêmica e chega a ser contestada judicialmente, já que, à época, o candidato pesava apenas 58 quilos, sendo um pioneiro Rei Momo magro, coroado entre vários concorrentes obesos. Naquele ano, houve uma alteração no regulamento e o principal critério levado em consideração pela comissão julgadora foi a detenção de “baianidade e notoriedade cultural” por parte dos postulantes. A coroação de Mestre Calá na abertura dos Festejos de Momo aconteceu no bairro de Cajazeiras, fato histórico para um reinado que, de forma pioneira, priorizou bairros populares de Salvador, expandindo a atuação do monarca que antes era fundamentalmente restrita à região central da cidade.

2012

No dia 20 de novembro de 2012, Dia da Consciência Negra, é lançado, na Assembleia Legislativa do Estado da Bahia (Alba), o livro Clarindo Silva – O Dom Quixote do Pelourinho, de autoria do jornalista e publicitário Vander Prata. A publicação, que traz apresentação do deputado estadual Marcelo Nilo e prefácio do jornalista zédejesusbarreto (José de Jesus Barreto), integra a Coleção Gente da Bahia, série de biografias de personalidades baianas editada pelo departamento cultural da Casa (ALBA Edições), sendo a única obra da série a receber duas impressões. O autor valeu-se de mais de 80 horas de entrevistas com Clarindo, amigos e familiares, bem como de extensa consulta em arquivos e antigos periódicos da cidade para a escrita do livro.

2013

Em outubro de 2013, o Projeto Cultural Cantina da Lua celebra os 30 anos da Festa da Bênção, evento considerado o principal alavancador do processo de revitalização do Centro Histórico de Salvador e que, por ser realizado no segundo dia útil da semana, ficaria mais conhecido como Terça da Bênção. Inicialmente, a celebração contou com as adesões do Olodum, que fixou a terça-feira como dia oficial de ensaio do bloco; dos Filhos de Gandhy, que criou a Seresta do Gandhy no mesmo dia da semana; além do Commanche, de Jorginho Commancheiro, criador da expressão “Pelô”. No primeiro ano de aniversário da Bênção, em 1984, o Projeto Cultural Cantina da Lua trouxe a cantora e atriz Zezé Motta, atraindo mais de 2 mil pessoas para a comemoração no Terreiro de Jesus. Já a celebração dos 30 anos teve como homenageado o compositor Paulinho Camafeu, em um grande show que contou, ainda, com as presenças de Gilberto Gil, Armandinho e Luiz Caldas.

2016

Em celebração realizada na Cantina da Lua, é lançada no dia 14 de setembro de 2016 a 5ª edição do livro Memórias da Cantina da Lua, de Clarindo Silva. A publicação traz prefácio de Eliene Bina e novos textos de amigos e personalidades caras ao autor, que se somam a outros relatos e ao texto autobiográfico já contidos nas edições anteriores da obra. A cerimônia de lançamento do livro reserva, ainda, a inauguração de uma placa ao deputado Marcelo Nilo, então presidente da Assembleia Legislativa do Estado da Bahia, que por meio de seu braço editorial (ALBA Edições) é responsável pela publicação desta nova edição.

2019

Em julho de 2019, o grupo Bambas de Sampa realiza duas apresentações no Sesc Pompeia, em São Paulo, promovendo o encontro entre Riachão e Martinho da Vila. O espetáculo Se Deus quiser vou chegar aos 100 conta com a presença de Clarindo Silva, grande amigo dos veteranos sambistas e do jovem produtor Paulinho Timor, idealizador e integrante do conjunto paulistano. A homenagem a Mestre Calá se estende à ambientação do show, que traz referências cenográficas à Cantina da Lua e apresenta o anfitrião preparando a sua premiada caipirinha de limão. Três anos antes, no mesmo Sesc Pompeia, Clarindo Silva já havia acompanhado o amigo Riachão em uma apresentação dos Bambas de Sampa. Em 2015, o grupo foi homenageado com uma placa na galeria da Cantina da Lua pelo proprietário e anfitrião Clarindo Silva.

2021

No ano em que completa meio século à frente da Cantina da Lua, Clarindo Silva lança seu segundo livro, Conversa de Buzú, apresentando crônicas baseadas em conversas coletadas em seus deslocamentos pela cidade em ônibus municipais. Ao mesmo tempo, sua obra de estreia, Memórias da Cantina da Lua, alcança a 6ª edição, trazendo novos depoimentos, como da atriz Bete Mendes, das jornalistas Carmela Talento e Doris Pinheiro, dentre outros amigos e colaboradores do Projeto Cultural Cantina da Lua. No início do ano, também vai ao ar o canal do YouTube da Cantina da Lua, apresentando a série de lives Histórias do Pelourinho por Mestre Calá. Por fim, é inaugurado o Memorial Cantina da Lua, um acervo digital que documenta o histórico de ações do espaço que é um dos bastiões de resistência cultural do Centro Histórico de Salvador. As iniciativas são fruto de editais aprovados por meio da Lei Aldir Blanc, que viabilizou recursos emergenciais para o setor cultural de todo o país.